Atenção primária: a bola da vez

O sistema de saúde brasileiro está passando por momentos difíceis, tanto na esfera pública quanto na privada! Operadoras de saúde têm batalhado para buscar modelos mais sustentáveis e diversas estratégias estão sendo desenvolvidas nesse sentido: mudanças no modelo de fee for service, relacionamento mais próximo com os pacientes, desenvolvimento de tecnologias para monitoramento de sinistros e, principalmente, fortalecimento da Atenção Primária!

A estratégia de saúde da família adotada pelo SUS desde o início dos anos 90 passou por algumas transformações ao longo dos anos, mas manteve o modelo de equipe multidisciplinar envolvida no cuidado às famílias! Nesse modelo, teoricamente, todo paciente seria vinculado a uma equipe assistencial e todo mundo deveria ter seu “médico de referência”. Esse médico, ideologicamente, deveria ser um médico de família, com formação adequada para garantir a resolutividade de cerca de 80% das demandas atendidas na unidade de saúde.

Mas, o Brasil é um país de paradoxos! Embora essa fosse a estratégia assistencial definida pelo SUS, nunca houve incentivo (boas condições de trabalho, remuneração adequada, plano de carreira, etc) para os médicos de família. Desse modo, o que acontece há anos é que médicos generalistas (sem residência em medicina de família) assumem essas vagas nos postos de saúde provisoriamente, até  iniciarem uma especialização em alguma área da medicina (que geralmente não é a medicina de família). Assim, os pacientes não criam vínculo com seus médicos, pois a rotatividade de profissionais é imensa!

Essa breve análise justifica parcialmente a grande carência de médicos de família no mercado atual. Como não havia boas perspectivas para a especialidade e as oportunidades de trabalho eram quase que exclusivamente no serviço público, essa área da medicina ficou marginalizada durante muitos anos. Me lembro que quando decidi fazer medicina de família ouvi os comentários mais absurdos dos meus colegas: “Você vai fazer medicina de postinho?” “Vai fazer essa especialidade porque tem medo de não passar na prova de outra área?” “Por que você não escolhe uma área melhor?”.

Atualmente, o cenário é diferente! O médico de família bem formado está sendo disputado no mercado de trabalho, especialmente pela saúde suplementar! As operadoras demoraram a enxergar que o investimento em promoção de saúde e prevenção de doenças é mais viável que o modelo hospitalocêntrico, mas agora a ficha caiu e estão todos correndo para desenvolver as melhores estratégias!

Hoje, participando de um evento internacional de Telemedicina e Saúde Digital em São Paulo (Global Summit Telemedicine & Digital Health) ouvi palestrantes de diferentes países (EUA, Bélgica, Alemanha, Israel...) apresentando trabalhos fantásticos em saúde digital! A telemedicina já é uma realidade em vários países do mundo e está cada vez mais presente também no Brasil. Mas me chamou a atenção o fato de que mesmo nesses países, com altíssimo grau de tecnologia, as propostas também esbarram na carência de médicos de família! Eles são peças chave para que o modelo dê bons resultados, ou seja, promovam saúde e bem-estar para os pacientes, diminuam a hospitalização, promovam significativa redução de custos e diminuam a carga de doenças da população.

Acompanhemos as cenas dos próximos capítulos dessa história, mas uma coisa é certa: o fortalecimento de atenção primária não tem volta e as empresas que aliarem tecnologia com medicina de família sairão na frente nesse novo mercado de saúde!

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